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Sobre as doenças de São Francisco

Texto Original

De infirmitatibus sancti Francisci

Caput CLX - Quomodo contulit cum quodam fratre de subveniendo corpori.

 

210 
1 Per labores innumeros et aegritudines validas in semitis Christi vestigia posuit (cfr. Ios 3,13) praeco Dei Franciscus, nec pedem retraxit, donec quae perfecte coepit perfectius consummavit (cfr. Luc 14,30). 
2 Nam cum lassatus esset (cfr. Iudc 16,16) et totaliter corpore conquassatus, numquam a perfectionis suae substitit cursu, numquam rigorem passus est inflectere disciplinae. 
3 Nam et exhausto iam corpori sine conscientiae murmure nequibat vel in modico subvenire. 
4 Itaque cum oporteret ipsum etiam nolentem proprii corporis incommoda, quae vires eius excesserant, blandimentis remediabilibus delinire, quemdam fratrem, quem sciebat consilium sibi daturum expediens, benigne die quadam alloquitur: 
5 “Quid tibi videtur, fili carissime, quod conscientia mea de cura corporis frequenter submurmurat? 
6 Timet ne infirmanti nimis indulgeam, et exquisitis ei studeam fomentis succurrere. 
7 Non quod ipsum iam aliquid delectet accipere infirmitate longa confectum, a quo totius saporis recessit impulsus”.

 

211 
1 Respondit filius diligenter ad patrem, a Domino sibi dari verbum responsionis agnoscens: “Dic mihi, si dignaris, o pater, qua diligentia corpus tuum, dum potuit, tuis obtemperavit mandatis?”. 
2 Qui ait: “Testimonium illi perhibeo (cfr. Ioa 5,31), fili, quia per omnia obediens (cfr. Col 3,20) fuit, in nullo sibimetipsi pepercit, sed quasi praeceps ad cuncta ferebatur imperia. 
3 Nullum subterfugit laborem, nullum declinavit incommodum, tantummodo iussa posset perficere (cfr. Iudc 9,54). 
4 In hoc perfecte convenimus ego et ipsum, ut sine aliqua repugnantia Christo Domino serviremus (cfr. Col 3,24)”. 
5 Et ait frater: “Ubi est ergo, pater, liberalitas tua, ubi pietas et summa discretio? 
6 Estne ista fidelium amicorum (cfr. Sir 6,14) redhibitio digna, beneficium libenter accipere nec tempore necessario danti pro merito respondere? 
7 Quid servitii Domino tuo Christo (cfr. Col 3,24) absque auxilio corporis hactenus impendere potuisti? 
8 Nonne, ut ipse fateris, propter hoc se omni periculo dedit?”. 
9 “Fateor, fili”, ait pater, “hoc esse verissimum”. 
10 Et filius: “Estne hoc rationis conveniens, ut tam fideli amico (cfr. Gen 18,25) in tanta necessitate desis, qui se et sua pro te usque ad mortem exposuit? 
11 Absit a te, pater, auxilium et baculus afflictorum, absit a te hoc peccatum in Domino (cfr. 1Re 12,23)!”. 
12 “Benedictus et tu”, inquit, “fili (cfr. 1Re 26,25), qui sapienter meis disceptationibus tam salutaria remedia propinasti!”. 
13 Et coepit hilariter loqui ad corpus: “Gaude, frater corpus, et parce mihi (cfr. Iob 7,16), quia, ecce, iam tua placita libenter perficio, libenter tuis querulis affectibus subvenire festino!”. 
14 Sed quid iam exstinctum poterat delectare corpusculum? 
15 Quid sustentare ex omni parte collapsum? 
16 Mortuus erat Franciscus iam mundo, sed Christus vivebat in (cfr. Gal 2,19.20) eo. 
17 Crux illi erant mundi deliciae, quia Christi crucem (cfr. Gal 6,14) radicatam gerebat in corde. 
18 Et ideo stigmata exterius fulgebant in carne, quia intus radix altissima excrescebat in mente.

Texto Traduzido

De infirmitatibus sancti Francisci

Capítulo 160 - Como conversou com um irmão sobre como servir o corpo.

 

210 
1 Francisco, pregoeiro de Deus, marcou seus vestígios nos caminhos de Cristo no meio de trabalhos sem conta e de fortes sofrimentos, e não arredou o pé enquanto não terminou com maior perfeição o que soubera começar tão bem. 
2 Mesmo quando estava cansado e com o corpo todo alquebrado, nunca abandonou seu caminho de perfeição e nunca se permitiu uma quebra no rigor da disciplina. 
3 Não conseguia ajudar o corpo exausto nem um pouquinho sem que a consciência murmurasse. 
4 Por isso quando, contra a sua vontade, foi preciso aliviar com remédios os incômodos de seu corpo que já eram maiores que suas forças, falou bondosamente a um dos irmãos, na certeza de que lhe daria um bom conselho: 
5 “Que pensas, filho caríssimo, dessas reclamações constantes de minha consciência pelos cuidados com o corpo? 
6 Ela tem medo de que eu seja muito condescendente com o enfermo e lhe faça regalos desnecessários. 
7 Mas não é porque esse corpo já alquebrado pela longa doença possa receber alguma coisa com prazer: ele já perdeu toda vontade de se satisfazer”.

 

211 
1 O filho respondeu ao pai diligentemente, sabendo que o Senhor que lhe dava a palavra da resposta: “Dize-me, por favor, pai, por acaso não foi com diligência que teu corpo obedeceu a tuas ordens, enquanto lhe foi possível?” 
2 O santo respondeu: “Filho, eu lhe dou testemunho de que foi obediente em tudo, nunca poupou a si mesmo e até se precipitava para obedecer ao que eu queria. 
3 Não fugiu de trabalho nenhum, não escapou de nenhum incômodo, só quis cumprir o que eu mandava. 
4 Neste ponto estamos completamente de acordo, eu e ele: serviremos ao Senhor Cristo sem nenhuma repugnância”. 
5 Disse o frade: “Então, pai, onde estão a tua generosidade, a tua piedade, a tua grande discrição? 
6 Será que essa é uma retribuição digna dos amigos fiéis: com boa vontade na hora de receber o benefício mas sem saber retribuir quando é o outro que precisa?
7 Que serviço pudeste prestar até agora a teu Cristo Senhor sem a colaboração de teu corpo? 
8 Não foi para isso que ele se entregou a todos os perigos, como tu mesmo estás confessando?” 
9 O pai respondeu: “Meu filho, confesso que isso é bem verdadeiro”. 
10 E o filho: “E seria conveniente que, na hora da necessidade, faltasses para com tão fiel amigo, que por ti se entregou à própria morte com tudo que possuía? 
11 Longe de ti, pai! Longe de ti, que és auxílio e apoio dos aflitos, cometer esse pecado diante do Senhor!” 
12 O santo respondeu: “Bendito sejas tu também, filho, que com sabedoria puseste remédios tão salutares nas minhas dúvidas!” 
13 E, sorrindo, disse ao próprio corpo: “Alegra-te, irmão corpo, e me perdoa, porque agora vou tratar de cumprir com gosto tuas vontades, vou me apressar a atender tuas reclamações!” 
14 Mas o que poderia agradar àquele pobre corpo acabado? 
15 O que poderia soerguê-lo, agora que já estava todo derreado? 
16 Francisco já tinha morrido para o mundo, mas Cristo estava vivo nele. 
17 As delícias do mundo eram uma cruz para ele, porque levava a cruz de Cristo enraizada em seu coração. 
18 Por isso fulgiam exteriormente em sua carne os estigmas, cuja raiz tinha penetrado profundamente em sua mente.