Homilia da Sagrada Família - ano A - Frei João Santiago
Sagrada Família.
Mateus 2, 13-15.19-23
- “Depois da partida dos três magos, um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse: ‘Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito; fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para o matar’” (v. 13).
O Senhor toma a iniciativa e se faz presente a José em sonhos. José, docilmente, obedece, levanta-se, toma o menino Jesus e Nossa Senhora e foge para o Egito. No Egito vive em esperando como quem vive neste mundo como peregrino, como em atenção à Palavra e ao chamado divino. A “Sagrada Família” é exemplo de uma família que não vive só para si mesma, mas também para servir aos desígnios de Deus sobre ela.
- A vida tem suas tribulações, vendavais e tempestades que ameaçam derrubar nossa casa, nossa vida. Só a casa do homem sábio, edificada sobre a rocha, resiste e não cai. José, homem justo, não mero ouvinte, mas acima de tudo praticante da Palavra edifica a sua casa sobre a rocha, põe em ato, faz acontecer e realiza a Palavra, isto é, pratica a Palavra. De fato: “José levantou-se durante a noite, tomou o menino e sua mãe e partiu para o Egito” (v. 14).
- “Ali permaneceu até a morte de Herodes para que se cumprisse o que o Senhor dissera pelo profeta: ‘Do Egito chamei meu filho’ (Os 11,1)” (v. 15). Egito, símbolo da escravidão. O Senhor nos chama do “Egito”, nos tira de toda escravidão. O “Menino Deus”, fazendo-se nosso amigo, fazendo-se “Deus conosco”, “desce” ao nível que nos encontramos e nos resgata de todo tipo de “Egito”, pois Ele assumiu nossa humanidade e nossas dores. Esteve no “Egito” para se aproximar de nós. Sai do “Egito”, mas não quer sair sozinho: quer-nos junto com Ele. Tudo isso nos lembra do Credo que fala do “abaixamento” do Cristo (entrada no “Egito”) e da sua “saída do Egito”, da sua ressurreição: “... Creio em um só Senhor, Jesus Cristo ... E por nós, homens, e para nossa salvação, desceu dos céus: e se encarnou pelo Espírito Santo, / no seio da Virgem Maria, e se fez homem. Também por nós foi crucificado ... padeceu e foi sepultado. Ressuscitou ao terceiro dia ...”.
- “Quando Herodes morreu, o anjo do Senhor apareceu em sonho a José no Egito, e lhe recomendou: ‘Levanta-te toma o menino e a mãe e dirigi-te para Israel, pois morreram os que atentavam contra a vida do menino’. José levantou-se, tomou o menino e sua mãe e foi para a terra de Israel. Ao ouvir, porém, que Arquelau reinava na Judeia, em lugar de seu pai Herodes, não ousou ir para lá. Avisado divinamente em sonhos, retirou-se para a província da Galileia e veio habitar na cidade de Nazaré, para que se cumprisse o que foi dito pelos profetas: ‘Será chamado Nazareno’." (vv.19-23)
Disse Jesus: “Meu Pai trabalha e eu também trabalho”. O Evangelho narra que o Senhor aparece em sonho a José, faz-lhe recomendações, explica-lhe certas situações e dá alguns avisos. Tudo isso mostra a ação de Deus a fim de que uma história de salvação aconteça e o mundo não se perca. Já no passado, através de Abraão – homem idoso - o Senhor Deus “projetou” uma descendência salvadora. No relato do Evangelho de hoje é dito que o resgate da humanidade se dá através do “Nazareno”, alguém criado na desconhecida cidade chamada Nazaré (“Nazareno” parece ser um qualificativo que significa “desdém”. Os profetas, sobretudo Isaías, anunciavam um servo de Deus humilde e desprezado). E, assim, vemos o método de Deus: salvar a humanidade salvando-nos de toda soberba, salvando-nos desde nova fragilidade.
- “...veio habitar na cidade de Nazaré”. Nosso Senhor por quase trinta anos habitou em Nazaré. Longos anos como carpinteiro: fazendo e vendendo bancos e mesas para os vizinhos. Vida escondido, vida anônima. O Filho de Deus, o “Deus conosco”, o Salvador, o Esperado pelas nações, o Messias, daquele jeito levava a vida. Desilusão para alguns ou para quase todos. Na verdade, toda a rotina, todo o nosso cotidiano, o nosso instante presente, estava sendo redimido pelo Verbo de Deus que tinha se tornado “pés e mãos” naquela casa de Nazaré. Jesus criança, adolescente e jovem, tendo amigos, frequentando a “escola”, prestando um serviço, rezando, indo a um casamento, conversando com aquela senhora e com aquele senhor, visitando um doente, brincando com os colegas, passando por dificuldades e tendo que tomar decisões.... Nazaré, lugar onde ganhamos a companhia do nosso Deus e onde aprendemos que aos olhos da fé o nosso dia-a-dia e o nosso instante de cada momento “estão cheios”.... Vivamos o presente, portanto.