Homilia do XII Domingo do Tempo Comum - ano C / Frei João Santiago
XII Domingo do Tempo Comum (Lc 9,18-24)
Celebrando a Ressurreição do Senhor, o Evangelho deste domingo nos convida a uma vida de oração que nos leve, finalmente, a ceder à Vontade do Pai. Um exorcismo nós precisamos fazer: exorcizar falsas idéias de Deus. O Nosso Deus assume a “Cruz”, injetando, assim, aquele remédio que dá sentido a todas as cruzes que passamos em nossas vidas: não as passamos sozinhos e nem caímos nos absurdos da vida, pois Cristo se faz presente sejam quais foram as cruzes que caiam em nossas ombros. A injustiça, todo e qualquer mal, é vencido, também, quando o combatemos dentro de nós mais do que quando combatemos nos outros. É nossa fidelidade ao bem que poderá trazer um pouco de Reino de Deus a esta terra. Obviamente toda fidelidade exige dedicação, sacrifício, cruz.
- "Num dia em que ele estava a orar a sós com os discípulos” (v. 18). “Abba, Pai! Faça-se tua vontade” (Mc 14, 36): confiança total e sem reservas em Deus, seu Pai. Diante das contradições, Jesus rezava, não para se livrar delas necessariamente, mas para fazer a vontade do Pai. Dag Hammarskjold dizia: rezar é dizer “obrigado” por tudo que houve, e dizer “sim” ao que virá. Os discípulos de dois mestres famosos encontraram-se juntos. Então os discípulos de um dos dois mestres começaram a listar a incrível série de milagres, prodígios e curas que seu mestre fazia. No final eles perguntaram: "E o seu mestre quais milagres realiza?". E o outro grupo respondeu: "Para vocês é milagre se Deus faz a vontade de um homem; para nós é milagre se um homem faz a vontade de Deus”.
Jesus rezando, nos convida a uma radicalidade tremenda em busca de ouvir a voz do Alto e a Luz do Céu (“Entra no teu quarto e reza ao teu Pai em segredo”). Façamos um sério exame e por certo daremos conta que na verdade vivemos de outras luzes e de outras vozes (vozes e luzes da vaidade, do glamour, da ostentação, da saúde, da honra, da própria justiça, do poder, do dinheiro, do prazer, da própria agressão). Jesus nos convida a acessar a vida do Eterno em nós, a vida verdadeira. Certamente que uma vida de oração tal como nos indica Jesus mudaria muito a cada um de nós.
- “... perguntou-lhes: ‘Quem dizem que eu sou?’ Responderam-lhe: ‘Uns dizem que és João Batista; outros, Elias; outros pensam que ressuscitou algum dos antigos profetas’. Perguntou-lhes, então: ‘E vós, quem dizeis que eu sou?’ Pedro respondeu: ‘O Cristo de Deus’ (vv. 18-20).
Quem é Deus para mim? O que Deus fez por mim? Podemos imaginar alguns personagens respondendo:
Zaqueu (19,1-10): Ele curou meu complexo de inferioridade e preencheu meu o coração vazio de tantos bens. O cego de Jericó (18, 35-43): Ele curou aquele meu fechamento ao amor, à alegria, à compaixão. Agora vejo que a vida é bonita. A mulher encurvada (13,10-17): Ele me livrou daquele mal que me fazia carregar os problemas alheios. Ele me livrou do complexo de culpa, dos escrúpulos. Eu não vivia, só vegetava. A hemorroísa (9,43-48): Ele curou minha identidade feminina. A filha de Jairo (9,40-56): Com Ele perdi o medo de crescer. Com Ele deixei de sentir ódio aos meus pais. Maria Madalena (8.2): Ele me acolheu e o encontrei um amparo neste mudo. Ele curou minha loucura, meu desespero.
E, para você, o que Senhor fez?
- “Ele acrescentou: ‘É necessário que o Filho do Homem padeça muitas coisas, seja rejeitado pelos anciãos, pelos príncipes dos sacerdotes e pelos escribas. É necessário que seja levado à morte e que ressuscite ao terceiro dia’. Em seguida, dirigiu-se a todos: ‘Se alguém quer vir após mim, renegue-se a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e siga-me’ (vv. 22-23).
Cruz. A “cruz” era a pena capital para quem ousava afrontar um mundo marcado pela escravidão e pela força das armas. Ora, o Filho do Homem pregando valores como acolhida, igualdade, mansidão, partilha, etc. desmontava toda a mentalidade mundana que mantinha e sustentava aquele mundo. O cristão, carregando a cruz, aceita as consequências dolorosas pelo fato de ter praticado o bem, aceita a cruz, a pena, a injustiça. A “cruz” é o peso de nossa fidelidade pela adesão feita ao Senhor e aos nossos bons compromissos. Nosso Senhor afirma que este é o caminho para vencer o mal no mundo. Não adiante afrontar o mal com o mal. Jesus anuncia um mundo alternativo ao mundo do pecado. Inexoravelmente o cristão assumirá a cruz, pois é contrário ao mundo pecador marcado pelo “toma-lá-da-cá”, pela mentira, pela calúnia, etc. Temos a cruz de cada dia quando a cada dia procuramos ser fiel ao cônjuge, à família; quando procuramos ser honestos, verdadeiros, etc. Por vezes também é a solidão quando preferimos a fidelidade a Deus mais do que ao mal, ao pecado.
Caso você julgue que alguém seja importante para você. Isso é só um parecer. Mas a prova virá quando você souber até quanto poderá sofrer por ele ou ela. Em outras palavras, o sofrimento prova o quanto algo ou alguém vale para você. Escolhendo a verdade e o bem pode ser que venham adversidades (cruz) e neste momento a pessoa será chamada a decidir se prefere deixar o bem e a verdade de lado ou se render ao revanche, ao desespero, ao mal.
O sofrimento pode ter sentido. Veja-se o sofrimento advindo pelas vezes nas quais você teve que aceitar incompreensões por ter tomado a decisão justa e correta. Veja-se o sofrimento advindo quando tentaram destruir a você por inveja do bem que você fez. O sofrimento pode vir também quando você precisa mudar o modo de pensar e deixar certas atitudes e assumir outras. Semear o bem jamais será em vão: mais cedo ou mais tarde colher-se-á seus frutos.
Jesus se diz “Filho do Homem”. Um Messias “Filho do Homem”, isto é, um Messias servidor da humanidade. “Filho do Homem” é o modelo do verdadeiro humano, do verdadeiro ser humano. O mundo tem a marca de seus habitantes, homens que formam um mundo marcadamente agressivo, impiedoso, nacionalista, corporativista, etc. Diante de um ser humano que mais parece uma fera selvagem (O homem é o lobo do homem) temos o Filho do Homem. Tal Filho será atacado pelas feras selvagens, pois tal Filho mostra uma humanidade nova.
Jesus lança a proposta: “Se alguém quiser vir comigo.....”. Em outras palavras, qual ser humano você quer ser? Um “homem feroz” ou um “Filho do Homem”?
- “Porque, quem quiser salvar a sua vida, irá perdê-la; mas quem sacrificar a sua vida por amor de mim, irá salvá-la” (v. 24). Jesus também fala do retorno, do lucro, que se tem quando se leva a vida pautando o modelo do Filho do Homem: não perderá a vida, ressurgirá. Isto é: o melhor investimento a fazer com os anos que se passam de nossas vidas é usá-los em serviço. Neste sentido podemos nos perguntar se as pessoas que passaram por nós saíram enriquecidas por terem convivido conosco? Qual legado eu deixo por onde passo?
Jesus também fala de um fracasso, de uma vida falida: a vida que se acomoda, que não o segue. Temos que fazer um bom investimento com a vida. O Evangelho de hoje diz que podemos investir na vida procurando salvá-la (Retê-la para meus caprichos). Tal investimento não trará muito lucro, terá investido em coisas sem futuro: a vida que traiu a si mesma quando traiu o bem, a verdade, o seguimento de Jesus.