Homilia do XXXII Domingo do Tempo Comum - ano C / Frei João Santiago
XXXII Dom Comum Lucas 20, 27-38
- 27."Alguns saduceus – que negam a ressurreição – aproximaram-se de Jesus e perguntaram-lhe: 28.“Mestre, Moisés prescreveu-nos: Se alguém morrer e deixar mulher, mas não deixar filhos, case-se com ela o irmão dele, e dê descendência a seu irmão (Cf. Dt 25, 5). 29.Ora, havia sete irmãos, o primeiro dos quais tomou uma mulher, mas morreu sem filhos. 30.Casou-se com ela o segundo, mas também ele morreu sem filhos. 31.Casou-se depois com ela o terceiro. E assim sucessivamente todos os sete, que morreram sem deixar filhos. 32.Por fim, morreu também a mulher. 33.Na ressurreição, de qual deles será a mulher? Porque os sete a tiveram por mulher”.
Os saduceus consideravam revelados por Deus somente os cinco primeiros livros da Bíblia, negavam a ressurreição e qualquer modalidade de vida após a morte. Fazem, para Jesus, a pergunta sobre a ressurreição com aquele espírito de troça ou chacota: a mulher será de quem, se ela foi dos sete?
Há os que acreditam na imortalidade da alma (Os espíritas dizem que a alma se desencarna para se reencarnar. Outros dizem que a alma, deixando o corpo, vai para o mundo divino). Há aqueles que, como os fariseus, acreditam na ressurreição como uma restauração melhorada desta vida. E há outros que, como os saduceus, não conseguem ver vida nenhuma após a morte. Nós, católicos, com Jesus afirmamos: “enxertados” em Cristo pelo santo batismo e procurando sempre a vida nova do Cristão, já possuímos a vida do Eterno em nós, e, após o nosso falecimento, continuaremos a viver no Senhor de forma mais plena, sem reservas, pois a figura deste mundo passa e haverá “Novos Céus e nova terra”.
- 34.“Jesus respondeu: ‘Os filhos deste mundo casam-se e dão-se em casamento, 35.mas os que serão julgados dignos do século futuro e da ressurreição dos mortos não terão mulher nem marido. 36.Eles jamais poderão morrer, porque são iguais aos anjos e são filhos de Deus, porque são ressuscitados’”.
Há uma vida espiritual do Eterno que já se faz presente neste século para todos os cristãos. Desta vida vivemos e a morte não põe fim a esta vida do Eterno em nós. As pessoas julgadas dignas do século futuro e da ressurreição, como os anjos” (“Como Deus” – Gabriel -, “Força de Deus” – Miguel -, “Medicina de Deus” – Rafael -, “Olhos que veem a Deus face a face” – cf. Mt 18, 10), viverão de Deus, viverão da vida de Deus, terão o “sangue” do Pai, serão filhos do Pai, viverão da vida do Pai. Com a ressurreição nascemos plenamente para o nosso mistério. O nosso peregrinar neste mundo é uma gestação. Alimentados pela Palavra, pela vida fraterna e pela Eucaristia vamos ressuscitando até à plena ressurreição, até o desabrochar completo do nosso nome, da nossa identidade, do mistério de cada um de nós.
- 37. “Por outra parte, que os mortos hão de ressuscitar é o que Moisés revelou na passagem da sarça ardente (Cf. Ex 3,6), chamando ao Senhor: Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó. 38.Ora, Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos; porque todos vivem para ele”.
Deus é Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó. Ora, se Deus é Deus de vivos, reina sobre os vivos, reina sobre os três patriarcas. Em outras palavras: Abraão, Isaac e Jacó estão vivos com a mesma vida de Deus. Pode parecer estranho, mas Jesus afirma que Deus é nosso: é de Abraão, de Isaac e de Jacó. O “normal” seria dizer que Abraão, Isaac e Jacó são de Deus, mas diz “Deus é Deus de Abraão...”. Nosso Senhor diz também que todos vivem para Deus (“... Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos; porque todos vivem para ele”). Assim sendo, podemos dizer que há uma pertença recíproca tal como entre os esposos que se unem em aliança eterna: Deus é Deus de Abraão e Abraão vive para Ele. “O meu amado é meu, e eu sou dele” (Cant 2, 16). Para Jesus, os amantes de Deus vivem “ancorados” no Deus da vida e nem a morte os podem separar. “Nós sabemos que já passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos. Quem não ama permanece na morte” (1Jo 3, 14). Diante da resposta de Jesus acerca da ressurreição ou vida após a morte, vemos que a vitória sobre a morte “passa” pela nossa fé em Deus, pela prática de amor a Deus e ao irmão, muito mais do que por argumentos racionais. A morte, podemos encará-la como oportunidade para entrar na vida plena (“Morro porque não morro”: sofro por não morrer). Mas podemos também considerá-la com angústia, como um fruto do pecado: de fato, quando não me interesso nem por Deus (o Bem e a Verdade), nem por ninguém, termino me interessando só pelo meu “ego” e a morte parecerá sempre uma ameaça a este ego.
Neste sentido nossa fé na ressurreição é fé na fidelidade de um Amigo fiel (“Ele é meu”, diria Abraão). Ele é aquele que não me abandona. Se eu ponho nele meu presente e futuro, minha esperança e fé, minha vida durará para sempre, porque Deus, o Principio, a Origem, não passa, é para sempre. Simplesmente confio. E confio porque fiz uma aliança, um pacto: Ele é o centro de minha vida, n´Ele deposito meu bem-querer, meu amor. Viver amando a Deus significa confiar n´Ele e seguir adiante: não porque se saiba nitidamente o “local” aonde se vai, mas porque se tem familiaridade com Ele, Aquele que nos ama.
-Diz-se que quando o anjo bom da morte, enviado pelo Altíssimo, veio para levar Abraão, este disse: “Nunca se viu um amigo desejar a morte de um amigo!”. Então, o próprio Altíssimo Senhor e Deus respondeu: “Nunca se viu um amante rejeitar o encontro com o amado”. E Abraão respondeu: “Anjo bom da morte, leva-me.
Neste Domingo somos convidados a rever a qualidade de nossa relação com o Deus que Nosso Senhor nos revelou. Que Ele se torne a nossa vida, que o seu santo Nome se inscreva em nós, pois Ele faz questão de inserir o nosso nome no d´Ele: “Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó”. Que cada um possa colocar mudar de nome: “Ana de Deus”, “Antônio de Deus”, “Carlos de Deus”, etc