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Homilia do XXXII Domingo do Tempo Comum - ano C / Frei João Santiago

Publicado por Frei João de Araújo Santiago | 09/11/2019 - 07:55

XXXII Dom Comum Lucas 20, 27-38

27."Alguns saduceus – que negam a ressurreição – aproximaram-se de Jesus e perguntaram-lhe: 28.“Mestre, Moisés prescreveu-nos: Se alguém morrer e deixar mulher, mas não deixar filhos, case-se com ela o irmão dele, e dê descendência a seu irmão (Cf. Dt 25, 5). 29.Ora, havia sete irmãos, o primeiro dos quais tomou uma mulher, mas morreu sem filhos. 30.Casou-se com ela o segundo, mas também ele morreu sem filhos. 31.Casou-se depois com ela o terceiro. E assim sucessivamente todos os sete, que morreram sem deixar filhos. 32.Por fim, morreu também a mulher. 33.Na ressurreição, de qual deles será a mulher? Porque os sete a tiveram por mulher”.

Os saduceus consideravam revelados por Deus somente os cinco primeiros livros da Bíblia, negavam a ressurreição e qualquer modalidade de vida após a morte. Fazem, para Jesus, a pergunta sobre a ressurreição com aquele espírito de troça ou chacota: a mulher será de quem, se ela foi dos sete?

Há os que acreditam na imortalidade da alma (Os espíritas dizem que a alma se desencarna para se reencarnar. Outros dizem que a alma, deixando o corpo, vai para o mundo divino). Há aqueles que, como os fariseus, acreditam na ressurreição como uma restauração melhorada desta vida. E há outros que, como os saduceus, não conseguem ver vida nenhuma após a morte. Nós, católicos, com Jesus afirmamos: “enxertados” em Cristo pelo santo batismo e procurando sempre a vida nova do Cristão, já possuímos a vida do Eterno em nós, e, após o nosso falecimento, continuaremos a viver no Senhor de forma mais plena, sem reservas, pois a figura deste mundo passa e haverá “Novos Céus e nova terra”.

34.“Jesus respondeu: ‘Os filhos deste mundo casam-se e dão-se em casamento, 35.mas os que serão julgados dignos do século futuro e da ressurreição dos mortos não terão mulher nem marido. 36.Eles jamais poderão morrer, porque são iguais aos anjos e são filhos de Deus, porque são ressuscitados’”.

Há uma vida espiritual do Eterno que já se faz presente neste século para todos os cristãos. Desta vida vivemos e a morte não põe fim a esta vida do Eterno em nós. As pessoas julgadas dignas do século futuro e da ressurreição, como os anjos” (“Como Deus” – Gabriel -, “Força de Deus” – Miguel -, “Medicina de Deus” – Rafael -, “Olhos que veem a Deus face a face” – cf. Mt 18, 10), viverão de Deus, viverão da vida de Deus, terão o “sangue” do Pai, serão filhos do Pai, viverão da vida do Pai. Com a ressurreição nascemos plenamente para o nosso mistério. O nosso peregrinar neste mundo é uma gestação. Alimentados pela Palavra, pela vida fraterna e pela Eucaristia vamos ressuscitando até à plena ressurreição, até o desabrochar completo do nosso nome, da nossa identidade, do mistério de cada um de nós.

- 37. “Por outra parte, que os mortos hão de ressuscitar é o que Moisés revelou na passagem da sarça ardente (Cf. Ex 3,6), chamando ao Senhor: Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó. 38.Ora, Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos; porque todos vivem para ele”.

Deus é Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó. Ora, se Deus é Deus de vivos, reina sobre os vivos, reina sobre os três patriarcas. Em outras palavras: Abraão, Isaac e Jacó estão vivos com a mesma vida de Deus. Pode parecer estranho, mas Jesus afirma que Deus é nosso: é de Abraão, de Isaac e de Jacó. O “normal” seria dizer que Abraão, Isaac e Jacó são de Deus, mas diz “Deus é Deus de Abraão...”. Nosso Senhor diz também que todos vivem para Deus (“... Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos; porque todos vivem para ele). Assim sendo, podemos dizer que há uma pertença recíproca tal como entre os esposos que se unem em aliança eterna: Deus é Deus de Abraão e Abraão vive para Ele. “O meu amado é meu, e eu sou dele” (Cant 2, 16). Para Jesus, os amantes de Deus vivem “ancorados” no Deus da vida e nem a morte os podem separar. “Nós sabemos que já passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos. Quem não ama permanece na morte” (1Jo 3, 14). Diante da resposta de Jesus acerca da ressurreição ou vida após a morte, vemos que a vitória sobre a morte “passa” pela nossa fé em Deus, pela prática de amor a Deus e ao irmão, muito mais do que por argumentos racionais. A morte, podemos encará-la como oportunidade para entrar na vida plena (“Morro porque não morro”: sofro por não morrer). Mas podemos também considerá-la com angústia, como um fruto do pecado: de fato, quando não me interesso nem por Deus (o Bem e a Verdade), nem por ninguém, termino me interessando só pelo meu “ego” e a morte parecerá sempre uma ameaça a este ego.

Neste sentido nossa fé na ressurreição é fé na fidelidade de um Amigo fiel (“Ele é meu”, diria Abraão). Ele é aquele que não me abandona. Se eu ponho nele meu presente e futuro, minha esperança e fé, minha vida durará para sempre, porque Deus, o Principio, a Origem, não passa, é para sempre. Simplesmente confio. E confio porque fiz uma aliança, um pacto: Ele é o centro de minha vida, n´Ele deposito meu bem-querer, meu amor. Viver amando a Deus significa confiar n´Ele e seguir adiante: não porque se saiba nitidamente o “local” aonde se vai, mas porque se tem familiaridade com Ele, Aquele que nos ama.

-Diz-se que quando o anjo bom da morte, enviado pelo Altíssimo, veio para levar Abraão, este disse: “Nunca se viu um amigo desejar a morte de um amigo!”. Então, o próprio Altíssimo Senhor e Deus respondeu: “Nunca se viu um amante rejeitar o encontro com o amado”. E Abraão respondeu: “Anjo bom da morte, leva-me.

Neste Domingo somos convidados a rever a qualidade de nossa relação com o Deus que Nosso Senhor nos revelou. Que Ele se torne a nossa vida, que o seu santo Nome se inscreva em nós, pois Ele faz questão de inserir o nosso nome no d´Ele: “Deus de Abraão, Deus de Isaac, Deus de Jacó”. Que cada um possa colocar mudar de nome: “Ana de Deus”, “Antônio de Deus”, “Carlos de Deus”, etc

Sobre o autor
Frei João de Araújo Santiago

Frade Capuchinho, da Província Nossa Senhora do Carmo. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Teologia e Mestre em Teologia Espiritual. Tem longa experiência como professor, seja no Brasil, como na África, quando esteve como missionário. Por vários anos foi formador seja no Postulantado, como no Pós Noviciado de Filosofia. Atualmente mora em Açailândia-MA. Já escreveu vários livros e muitos artigos.