Homilia do XXXIII Domingo do Tempo Comum - ano A - Frei João Santiago
XXXIII Domingo do Tempo Comum - ano A - Mateus 25, 14-30.
Já estamos fazendo aqui e agora o nosso juízo final. O Senhor, no final, irá ler aquilo que nós estamos escrevendo agora.
14. “(O Reino dos Céus) Será também como um homem que, tendo de viajar, reuniu seus servos e lhes confiou seus bens. 15.A um deu cinco talentos; a outro, dois; e a outro, um ..... 16.Logo em seguida, o que recebeu cinco talentos negociou com eles; fê-los produzir, e ganhou outros cinco. 17.Do mesmo modo, o que recebeu dois, ganhou outros dois. 18.Mas, o que recebeu apenas um, foi cavar a terra e escondeu o dinheiro de seu senhor. 19.Muito tempo depois, o senhor daqueles servos voltou e pediu-lhes contas. 20.O que recebeu cinco talentos aproximou-se e apresentou outros cinco: ‘Senhor’ – disse-lhe –, ‘confiaste-me cinco talentos; eis aqui outros cinco que ganhei’. 21.Disse-lhe seu senhor: ‘Muito bem, servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito. Vem regozijar-te com teu senhor’. 22.O que recebeu dois talentos adiantou-se também e disse: ‘Senhor, confiaste-me dois talentos; eis aqui os dois outros que lucrei’. 23.Disse-lhe seu senhor: ‘Muito bem, servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito. Vem regozijar-te com teu senhor’”.
- O Evangelho desse domingo nos fala acerca do definitivo: “o Reino dos céus será também como um homem que, tendo de viajar para o exterior, chamou os seus servos e lhes confiou os bens.... Passado muito tempo, voltou o senhor daqueles servos e lhes pediu as contas” (vv. 14-15).
- A parábola fala de “talentos”. Cada ser humano passando por este mundo recebe “Talento”. Talento é a possibilidade que cada um tem e que de Deus recebeu (dons, dotes, sensibilidade, talentos, capacidades, emoções, ideais, amor, confiança, liberdade, bons desejos). Mas, é também mais do que isso. “Talento” sou eu mesmo, minha vida. E podemos dizer também que “talento” é o Espírito Santo, a herança que o Ressuscitado nos deixou. Tal Espírito Santo nos capacita a participar do projeto grande do Pai.
- Não estamos “órfãos”. O senhor nos deixou talentos, sua herança, seu Espírito Santo, sua força que se transforma em obras e práticas que promovem nossas famílias e comunidades. É só se deixar guiar pelo Espírito tal como uma árvore frutífera que recebendo luz e água sempre dá frutos. Que a Palavra seja eficaz, que nossos sacramentos nos santifiquem, que nossa caridade seja operosa.
- Mesmo que eu tenha recebido apenas um talento, sempre terei recebido muito e abundantemente. Com um talento (38 kg de metal precioso) uma família poderia passar muito bem e viver sossegada por 30 anos. Portanto, mesmo que eu tenha recebido um só talento, posso me considerar pleno e rico de capacidade para fazer da minha vida uma difusão do Espírito Santo, Espírito de amor. Trata-se de multiplicar os talentos. Mas multiplicar o talento tem seu preço e um preço bom. Um dia, depois de um aplaudidíssimo concerto, Andrés Segovia, considerado o maior violonista de todos os tempos, recebeu um fã que lhe disse: “Mestre, darei a vida para tocar como você!”. Andrés Segovia respondeu: “É exatamente o preço que eu paguei (pagou com a vida). Estás, meu jovem, disposto a fazer tudo o que eu fiz (estudos, dedicação, renúncias, lutas, lidar com invejas, solidão, etc.) para pôr para fora teu talento?” A vida que faz acontecer os talentos, que gera frutos, exige empenho e dedicação a fim de não sufocar o amor de Deus recebido, a fim de tornar a vida uma grande e alegre prestação de serviço aos que nos cercam.
- Um dia vi uma criança muito feliz. Estava radiante e exultante. Estavam ele e seu pai lavando o carro do pai. Mas para a criança o carro também era dele. Importava, para ele, está com o pai se dedicando a uma causa comum: lavar o carro. Assim, multiplicar os talentos é participar do projeto do Pai, não é uma “tortura”. Tem seu preço e um preço bom, gratificante.
- 24.Veio, por fim, o que recebeu só um talento: ‘Senhor, disse-lhe, sabia que és um homem duro, que colhes onde não semeaste e recolhes onde não espalhaste. 25.Por isso, tive medo e fui esconder teu talento na terra. Eis aqui, toma o que te pertence’. 26.Respondeu-lhe seu senhor: ‘Servo mau e preguiçoso! Sabias que colho onde não semeei e que recolho onde não espalhei. 27.Devias, pois, levar meu dinheiro ao banco e, à minha volta, eu receberia com os juros o que é meu
- Muitos se negam a participar do projeto do Pai. Entendem o Pai como um patrão carrasco que não confia em seus filhos, que exige só sacrifícios e não é capaz de amar e de partilhar sua vida. Diante de tal realidade vemos o quanto seja proveitosa e saudável uma sã imagem de Deus. Quem nos pode ofertar tal imagem saudável? Jesus crucificado – o doador de vida - enquanto mostra a potência divina e amorosa vencedora do mal, do pecado e da morte que campeiam no mundo.
Se enterrarmos aquilo que podemos ser, teremos, então, inutilizado o dom de Deus, a nossa própria vida: “Servo mau e preguiçoso!” (v. 26). Não basta viver, não basta estar vivo, importa multiplicar a vida, fazer outros vivos (“Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundancia” Jo 10,10). Parece que o servo mau e preguiçoso não aceita não ser o dono da vida, e não entende que a vida é um dom a ser doado, pois é no dom da vida que a vida se torna abundante.
- “Devias, pois, levar meu dinheiro ao banco e, à minha volta, eu receberia com os juros o que é meu” (v. 27): “Quem trata bem os pobres empresta ao Senhor, e ele o recompensará” (Pro 19,17).
- “28.Tirai-lhe este talento e dai-o ao que tem dez. 29.Será dado ao que tem e terá em abundância. Mas ao que não tem será tirado mesmo aquilo que julga ter. 30.E a esse servo inútil, jogai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes’”. Quem quiser prender o respiro para não perder o ar que se tem, morre sufocado. É no dom da vida que a vida se torna abundante.