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HOMILIA DOMINICAL / FREI JOÃO SANTIAGO

Publicado por Frei João de Araújo Santiago | 05/03/2016 - 13:58

O PAI MISERICORDIOSO

Lucas 15.

O Evangelho deste domingo é tão magnífico que nos convida mais ao silêncio do que falar, mais a contemplá-lo do que comentá-lo.  Gostaria de imaginar com vocês sobre o destino do filho mais velho.

Na cultura da época cabia ao filho mais velho ser o reconciliador familiar. Na parábola o filho mais velho se nega a exercer esse papel. O fato de aceitar ativamente a própria parte da divisão da herança terá assombrado o ouvinte. Ele tratou o pai como se já morto fosse, pois a herança se herda após o falecimento, não antes. Cabia ao filho mais velho salvaguardar a hospitalidade e deveria ser o principal anfitrião na festa promovida pelo pai. Além de se omitir, fez pior: teve uma discussão pública com o pai. Afrontou ao pai e cometeu um crime contra a cultura e contra a religião. Narra-se casos na época em que um pai matou um filho por isso. Na parábola, o pai tenta salvar o filho mais velho escutando as queixas deste e dando explicações:

28"O filho mais velho encheu-se de ira e não quis entrar. Então seu pai saiu e insistiu com ele.

29Mas ele respondeu ao seu pai: 'Olha! todos esses anos tenho trabalhado como um escravo ao teu serviço e nunca desobedeci às tuas ordens. Mas tu nunca me deste nem um cabrito para eu festejar com os meus amigos.

30Mas quando volta para casa esse teu filho, que esbanjou os teus bens com as prostitutas, matas o novilho gordo para ele!'

31"Disse o pai: 'Meu filho, você está sempre comigo, e tudo o que tenho é seu.

32Mas nós tínhamos que celebrar a volta deste seu irmão e alegrar-nos, porque ele estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi achado' ".

 

Há um romance teológico (Two Sons Have I Not de Kenneth Bailey) que imagina outras atitudes do pai a fim de salvar seu filho mais velho. O pai chega a conclusão que o a única maneira de abrir o coração do filho mais velho é ir desprotegido a ao encontro dele, mesmo sabendo que seu filho irado irá bater nele.

E o pai diz ao prefeito da cidade: “A disciplina trará mais rebelião. O perdão não mudará nada.... Se ele me bater, talvez então enxergue o motivo real de sua revolta”.

O prefeito responde: “Mas você não deve fazer isso. Você pode sair machucado”.

Pai: “Meu sofrimento será pior do que o que suporto agora? Será que meu coração está em paz quando meu filho se rebela e está tão distante de mim? Eu vou, meus amigos”.

Alguns minutos após a saída do pai, o padre e o prefeito ouvem o som de alguém sendo espancado com um cajado. Quando o prefeito pergunta ao padre o que irá acontecer ao filho mais velho, o padre dá a seguinte interpretação esperançosa:

Creio que ele vai arrepender-se. Pela primeira vez ele verá que seu orgulho na verdade significava que ele secretamente queria a morte do pai. Ficará chocado com o que fez, especialmente quando souber que o pai foi ao seu encontro de propósito, sabendo o que iria acontecer. Compreenderá num lampejo que o cajado deveria estar nas mãos do pai. Perceberá que não há nada que possa fazer para compensar por suas ações. Isso o levará a uma contrição de coração. Agora começara a ver um pouco da profundidade do amor de seu pai. Com a revolta extinta dentro dele, confessará sua indignidade e se arrependerá. Você não acha, Prefeito?”.

Jesus com essa parábola quer nos fazer entrar dentro da dramaticidade reinante no coração de Deus que quer salvar todos os seus filhos, e quer nos fazer entrar no drama do pecador que endurece a si próprio não acatando que a realidade não seja ao seu bel prazer e que se revolta contra a vida e contra o Criador. Deus, se deixando abater na cruz, permite ao homem ir até ao fundo da própria violência e o pecador assistindo o malefício feito sobre o inocente terá mais uma chance de recuperar em si a semelhança de Deus na qual foi criado.

Sobre o autor
Frei João de Araújo Santiago

Frade Capuchinho, da Província Nossa Senhora do Carmo. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Teologia e Mestre em Teologia Espiritual. Tem longa experiência como professor, seja no Brasil, como na África, quando esteve como missionário. Por vários anos foi formador seja no Postulantado, como no Pós Noviciado de Filosofia. Atualmente mora em Açailândia-MA. Já escreveu vários livros e muitos artigos.