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Homilia Dominical / Frei João Santiago

Publicado por Frei João de Araújo Santiago | 20/04/2017 - 07:40

I Dom Ressurreição  João 20, 1-9

"No primeiro dia que se seguia ao sábado, Maria Madalena foi ao sepulcro, de manhã cedo, quando ainda estava escuro. Viu a pedra removida do sepulcro. 2.Correu e foi dizer a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava: Tiraram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde o puseram! 3.Saiu então Pedro com aquele outro discípulo, e foram ao sepulcro. 4.Corriam juntos, mas aquele outro discípulo correu mais depressa do que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro. 5.Inclinou-se e viu ali os panos no chão, mas não entrou. 6.Chegou Simão Pedro que o seguia, entrou no sepulcro e viu os panos postos no chão. 7.Viu também o sudário que estivera sobre a cabeça de Jesus. Não estava, porém, com os panos, mas enrolado num lugar à parte. 8.Então entrou também o discípulo que havia chegado primeiro ao sepulcro. Viu e creu. 9.Em verdade, ainda não haviam entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dentre os mortos. 10.Os discípulos, então, voltaram para as suas casas."

 

- o “sepulcro” de Jesus não é lugar de solidão, separação, silêncio e morte, mas lugar de união, comunhão e vida, pois no “sepulcro” foram encontrados os panos colocados no chão, panos que exalavam o perfume do Esposo ("Tomaram o corpo de Jesus e envolveram-no em panos com os aromas - cem libras, trinta e três quilos,  de uma mistura de mirra e aloés- Jo 19, 39-40). No nosso “sepulcro”, aonde andaremos, havemos de encontrar um leito nupcial já preparado que exala o perfume do Esposo. A nossa morte será o encontro com Ele!

- Os discípulos “correram”. Que jamais deixemos de “correr” em busca do bem que um dia se apresentou em nossa vida. Eles conviveram com Jesus e quiseram novamente revê-Lo. Ainda “trabalhamos”, “corremos” e desejamos encontrar o “bem maior”, ou já vivemos cansados de buscar e pautamos nossa vida como que à deriva? 

- Diz-se que a única certeza é a morte. A ausência de Jesus no sepulcro infringe tal certeza. Ele não está ali. Recordar o santo “sepulcro” vazio é acabar com a lembrança da morte que acompanha e atormenta o homem.

“... com certeza vos afirmo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes, e não viram; e ouvir o que ouvis, e não ouviram” (Mt 13, 17). Viram e ouviram maravilhas: Jesus perdoando e salvando da morte uma mulher, acariciando as desprezíveis crianças da época, afrontando o poder para curar a mão atrofiada de um trabalhador, proferindo o caminho da felicidade no monte das bem-aventuranças, apaziguando a alma e corpo atormentados da mulher que sofria de hemorragia, fazendo voltar à vida Lázaro que já fedia..... Vendo tais maravilhas somos provocados a espedaçar nosso coração de pedra e com o coração de carne dizer: “É mesmo!” “É verdade!” “A vida é mais forte do que a morte!”. O caminho da vitória sobre a morte Jesus já nos ensinou: “Se lavardes aos pés uns dos outros”. A aposta de Jesus é que a prática do amor, realmente vence a morte. Quem ama de verdade é feliz e “sabe” que falecer é entrar na vida. A vitória sobre a morte, portanto, não é um enigma, um mistério mental, mas uma prática, a prática da caridade. Não é por acaso que Pedro só vê o “sepulcro” vazio, enquanto o discípulo amado vê e crê, crê que Jesus ressuscitou, entrou na Vida.

- O discípulo amado “viu”. Viu os lençóis que cobriram o corpo de Jesus. Aquele corpo que o discípulo amado reclinou no peito e escutou o segredo acerca do traidor. Aquele corpo que ele viu pendente na cruz. Aquele corpo que proferiu palavras tão belas para ele (“Eis aí tua mãe”). Aquele corpo perfumado e cuidado por ele para a sepultura. Aquele corpo deposto no sepulcro. Então... quando o discípulo amado “viu” aqueles lençóis e sentiu aquele perfume no sepulcro...., não somente “viu”, mas “viu” e se envolveu com tudo aquilo e se deixou levar pelo “cheiro” do bom Jesus ali presente. Este é um “olhar”, um “ver”, que gera fé. Por isso se diz que ele viu e acreditou. Ele viu rastos, “pegadas” do seu bem amado, reconheceu-o. Por isso que só quem ama pode crer de verdade.

- O discípulo amado e que amava. Podemos imaginar suas palavras: “Vendo e sentindo o bom odor daqueles lençóis eu caí, me rendi, fiquei sem mim, desfaleci, e me deixei ir. Sabia que me aproximava de alguma coisa. Eu estava me aproximando da coisa mais forte que jamais me acontecera. Aqueles lençóis e aquele bom perfume me chamavam. Quanto menos “sabia” de tudo aquilo, mais a doçura de um encontro se tornava meu destino: eu vi e acreditei”.

- O “outro discípulo”. O Evangelho nos convida a sermos “outro”. Urge superarmos o nosso “velho homem”, sejamos “outro”. Esse “outro” esteve - o único que esteve - aos pés da cruz. Amou de verdade Jesus, não o abandonou nem mesmo naquele momento de impotência, fraqueza e pobreza extrema. Amou e foi amado. Recebeu até a mãe de Jesus como mãe, recebeu um dos últimos olhares de Jesus na cruz: foi amado. Entre Jesus e o “outro” discípulo havia uma afinidade única, se conheciam bastante. Então.... quando ele viu o sepulcro vazio, os panos arrumados e o sudário colocado ao lado, foi capaz de concluir: “Ele está vivo”. Quando dois se amam, se conhecem, sabem os segredos um do outro.

- “Então o “outro” discípulo viu e acreditou”. O outro discípulo viu o que Pedro viu: “sepulcro” vazio, panos, sudário. Porém foi mais além, e passou do mero ver e constatar para uma adesão, um reconhecimento, uma rendição: acreditou que o Senhor ressuscitou, mesmo sem tê-lo visto. Quem ama ao ver um sinal vai mais alémUm dia uma criança desenhou algo e quis mostrar ao seu pai. O pai depois de olhar bem o desenho, não disse: “Que desenho bonito, desenhas bem, vou te colocar numa escola de artes”. Mas disse: “Eu também te amo, meu filho”. Aquele pai tinha entendido tudo! Entendeu que o filho estava querendo dizer: “Eu amo você papai!”.    

-  Uma mulher que prepara um prato e o serve ao seu marido, lança uma mensagem. O marido poderá captar a mensagem: “Ela me ama”. São João nos narra que uma mensagem foi dada (sepulcro vazio, panos perfumados, sudário longe do rosto de cristo). Por que Pedro não entendeu? Por que o outro discípulo captou, isto é, acreditou que Jesus venceu a morte? Sinal do amado. O Senhor nos manda sinais. Qual será o segredo para entendê-los e até mesmo para dar-se conta deles? O segredo será aquilo que há entre eu e o Senhor Deus. Entre o outro discípulo, o discípulo amado, e o Senhor Jesus havia amor. O amor se torna o elemento fundamental para entrar no mistério da ressurreição, melhor, no mistério de Jesus ressuscitado. Jesus resuscitado foi “percebido” só por alguns, não por todos. O discípulo amado percebeu, pois o amor tem essa capacidade de fazer conhecer a pessoa a quem se ama. O Evangelho de hoje é um convite a fazer experiência do Ressuscitado, e tal experiência só levaremos a cabo se o Senhor for realmente uma pessoa a quem entregamos nosso amor.

- Alguém pode se perguntar: “Mas porque não se mostra logo de uma vez para meus olhos materiais?”. Sabemos que Maria Madalena teve essa visão e até “segurou” com mãos fortes a Jesus. O Mestre disse a Madalena: “Não me detenhas, mas vai dizer aos irmãos.....”. Não se deixando deter por nossos olhos de carne, Jesus cria uma chance para nós: a chance, a oportunidade de fazermos, cada um, a própria Páscoa. Os sinais em nossas vidas, sepulcro vazio, lençóis estendidos no chão, o bom odor e o sudário de lado atiçam o nosso desejo como que dizendo: “Agora é a vossa vez”.

 

Concluindo, gostaria de desejar-vos uma santa e feliz Páscoa.

Páscoa é um desabrochar. O ovo é símbolo de renascimento e de um mundo novo. Aquilo que só era um ovo se torna um pintinho. Feliz Páscoa: que na sua vida possa nascer algo de totalmente novo, maravilhoso e até mesmo algo inesperado. Que o novo que virá preencha o seu coração, a sua vida e sua alma. Que com Cristo você faça também sua própria Páscoa.

Sobre o autor
Frei João de Araújo Santiago

Frade Capuchinho, da Província Nossa Senhora do Carmo. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Teologia e Mestre em Teologia Espiritual. Tem longa experiência como professor, seja no Brasil, como na África, quando esteve como missionário. Por vários anos foi formador seja no Postulantado, como no Pós Noviciado de Filosofia. Atualmente mora em Açailândia-MA. Já escreveu vários livros e muitos artigos.