Homilia Dominical / Frei João Santiago
I Dom Ressurreição João 20, 1-9
"No primeiro dia que se seguia ao sábado, Maria Madalena foi ao sepulcro, de manhã cedo, quando ainda estava escuro. Viu a pedra removida do sepulcro. 2.Correu e foi dizer a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava: Tiraram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde o puseram! 3.Saiu então Pedro com aquele outro discípulo, e foram ao sepulcro. 4.Corriam juntos, mas aquele outro discípulo correu mais depressa do que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro. 5.Inclinou-se e viu ali os panos no chão, mas não entrou. 6.Chegou Simão Pedro que o seguia, entrou no sepulcro e viu os panos postos no chão. 7.Viu também o sudário que estivera sobre a cabeça de Jesus. Não estava, porém, com os panos, mas enrolado num lugar à parte. 8.Então entrou também o discípulo que havia chegado primeiro ao sepulcro. Viu e creu. 9.Em verdade, ainda não haviam entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dentre os mortos. 10.Os discípulos, então, voltaram para as suas casas."
- o “sepulcro” de Jesus não é lugar de solidão, separação, silêncio e morte, mas lugar de união, comunhão e vida, pois no “sepulcro” foram encontrados os panos colocados no chão, panos que exalavam o perfume do Esposo ("Tomaram o corpo de Jesus e envolveram-no em panos com os aromas - cem libras, trinta e três quilos, de uma mistura de mirra e aloés- Jo 19, 39-40). No nosso “sepulcro”, aonde andaremos, havemos de encontrar um leito nupcial já preparado que exala o perfume do Esposo. A nossa morte será o encontro com Ele!
- Os discípulos “correram”. Que jamais deixemos de “correr” em busca do bem que um dia se apresentou em nossa vida. Eles conviveram com Jesus e quiseram novamente revê-Lo. Ainda “trabalhamos”, “corremos” e desejamos encontrar o “bem maior”, ou já vivemos cansados de buscar e pautamos nossa vida como que à deriva?
- Diz-se que a única certeza é a morte. A ausência de Jesus no sepulcro infringe tal certeza. Ele não está ali. Recordar o santo “sepulcro” vazio é acabar com a lembrança da morte que acompanha e atormenta o homem.
- “... com certeza vos afirmo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vedes, e não viram; e ouvir o que ouvis, e não ouviram” (Mt 13, 17). Viram e ouviram maravilhas: Jesus perdoando e salvando da morte uma mulher, acariciando as desprezíveis crianças da época, afrontando o poder para curar a mão atrofiada de um trabalhador, proferindo o caminho da felicidade no monte das bem-aventuranças, apaziguando a alma e corpo atormentados da mulher que sofria de hemorragia, fazendo voltar à vida Lázaro que já fedia..... Vendo tais maravilhas somos provocados a espedaçar nosso coração de pedra e com o coração de carne dizer: “É mesmo!” “É verdade!” “A vida é mais forte do que a morte!”. O caminho da vitória sobre a morte Jesus já nos ensinou: “Se lavardes aos pés uns dos outros”. A aposta de Jesus é que a prática do amor, realmente vence a morte. Quem ama de verdade é feliz e “sabe” que falecer é entrar na vida. A vitória sobre a morte, portanto, não é um enigma, um mistério mental, mas uma prática, a prática da caridade. Não é por acaso que Pedro só vê o “sepulcro” vazio, enquanto o discípulo amado vê e crê, crê que Jesus ressuscitou, entrou na Vida.
- O discípulo amado “viu”. Viu os lençóis que cobriram o corpo de Jesus. Aquele corpo que o discípulo amado reclinou no peito e escutou o segredo acerca do traidor. Aquele corpo que ele viu pendente na cruz. Aquele corpo que proferiu palavras tão belas para ele (“Eis aí tua mãe”). Aquele corpo perfumado e cuidado por ele para a sepultura. Aquele corpo deposto no sepulcro. Então... quando o discípulo amado “viu” aqueles lençóis e sentiu aquele perfume no sepulcro...., não somente “viu”, mas “viu” e se envolveu com tudo aquilo e se deixou levar pelo “cheiro” do bom Jesus ali presente. Este é um “olhar”, um “ver”, que gera fé. Por isso se diz que ele viu e acreditou. Ele viu rastos, “pegadas” do seu bem amado, reconheceu-o. Por isso que só quem ama pode crer de verdade.
- O discípulo amado e que amava. Podemos imaginar suas palavras: “Vendo e sentindo o bom odor daqueles lençóis eu caí, me rendi, fiquei sem mim, desfaleci, e me deixei ir. Sabia que me aproximava de alguma coisa. Eu estava me aproximando da coisa mais forte que jamais me acontecera. Aqueles lençóis e aquele bom perfume me chamavam. Quanto menos “sabia” de tudo aquilo, mais a doçura de um encontro se tornava meu destino: eu vi e acreditei”.
- O “outro discípulo”. O Evangelho nos convida a sermos “outro”. Urge superarmos o nosso “velho homem”, sejamos “outro”. Esse “outro” esteve - o único que esteve - aos pés da cruz. Amou de verdade Jesus, não o abandonou nem mesmo naquele momento de impotência, fraqueza e pobreza extrema. Amou e foi amado. Recebeu até a mãe de Jesus como mãe, recebeu um dos últimos olhares de Jesus na cruz: foi amado. Entre Jesus e o “outro” discípulo havia uma afinidade única, se conheciam bastante. Então.... quando ele viu o sepulcro vazio, os panos arrumados e o sudário colocado ao lado, foi capaz de concluir: “Ele está vivo”. Quando dois se amam, se conhecem, sabem os segredos um do outro.
- “Então o “outro” discípulo viu e acreditou”. O outro discípulo viu o que Pedro viu: “sepulcro” vazio, panos, sudário. Porém foi mais além, e passou do mero ver e constatar para uma adesão, um reconhecimento, uma rendição: acreditou que o Senhor ressuscitou, mesmo sem tê-lo visto. Quem ama ao ver um sinal vai mais além. Um dia uma criança desenhou algo e quis mostrar ao seu pai. O pai depois de olhar bem o desenho, não disse: “Que desenho bonito, desenhas bem, vou te colocar numa escola de artes”. Mas disse: “Eu também te amo, meu filho”. Aquele pai tinha entendido tudo! Entendeu que o filho estava querendo dizer: “Eu amo você papai!”.
- Uma mulher que prepara um prato e o serve ao seu marido, lança uma mensagem. O marido poderá captar a mensagem: “Ela me ama”. São João nos narra que uma mensagem foi dada (sepulcro vazio, panos perfumados, sudário longe do rosto de cristo). Por que Pedro não entendeu? Por que o outro discípulo captou, isto é, acreditou que Jesus venceu a morte? Sinal do amado. O Senhor nos manda sinais. Qual será o segredo para entendê-los e até mesmo para dar-se conta deles? O segredo será aquilo que há entre eu e o Senhor Deus. Entre o outro discípulo, o discípulo amado, e o Senhor Jesus havia amor. O amor se torna o elemento fundamental para entrar no mistério da ressurreição, melhor, no mistério de Jesus ressuscitado. Jesus resuscitado foi “percebido” só por alguns, não por todos. O discípulo amado percebeu, pois o amor tem essa capacidade de fazer conhecer a pessoa a quem se ama. O Evangelho de hoje é um convite a fazer experiência do Ressuscitado, e tal experiência só levaremos a cabo se o Senhor for realmente uma pessoa a quem entregamos nosso amor.
- Alguém pode se perguntar: “Mas porque não se mostra logo de uma vez para meus olhos materiais?”. Sabemos que Maria Madalena teve essa visão e até “segurou” com mãos fortes a Jesus. O Mestre disse a Madalena: “Não me detenhas, mas vai dizer aos irmãos.....”. Não se deixando deter por nossos olhos de carne, Jesus cria uma chance para nós: a chance, a oportunidade de fazermos, cada um, a própria Páscoa. Os sinais em nossas vidas, sepulcro vazio, lençóis estendidos no chão, o bom odor e o sudário de lado atiçam o nosso desejo como que dizendo: “Agora é a vossa vez”.
Concluindo, gostaria de desejar-vos uma santa e feliz Páscoa.
Páscoa é um desabrochar. O ovo é símbolo de renascimento e de um mundo novo. Aquilo que só era um ovo se torna um pintinho. Feliz Páscoa: que na sua vida possa nascer algo de totalmente novo, maravilhoso e até mesmo algo inesperado. Que o novo que virá preencha o seu coração, a sua vida e sua alma. Que com Cristo você faça também sua própria Páscoa.